Holding Patrimonial: Tratamento Contábil e Tributário de suas operações de venda de imóveis.
O tema não é novo, mas costuma ser questionado a todo momento, tanto pelos nossos clientes como por terceiros interessados em constituir ou revisar a sua Holding Patrimonial. Razão pela qual, vale revisitar o assunto, que é muito amplo e pode ser visto por diferentes prismas, mas que neste artigo visa somente afirmar alguns pontos.
Holding Patrimonial é uma pessoa jurídica constituída mediante a integralização de parte ou todo o acervo patrimonial de um indivíduo ou família. Sob este formato, apresenta vantagens, sendo as mais relevantes a redução da carga tributária, a facilitação sucessória e a organização patrimonial.
Antes de tratar das vendas dos imóveis e do seu tratamento tributário, é preciso deixar claro as 03 (três) formas diferentes de contabilização destes ativos, quais sejam:
· Estoques (Ativo Circulante). São aqueles imóveis adquiridos exclusivamente para serem vendidos.
· Investimentos (Ativo Não Circulante). São aqueles imóveis adquiridos para produzir algum tipo de rendimento, normalmente de aluguel.
· Imobilizado (Ativo Não Circulante). São aqueles imóveis adquiridos para uso da própria empresa.
Sob o aspecto tributário, as Holdings Patrimoniais normalmente optam pelo regime do Lucro Presumido, cuja tributação pode ser resumida da seguinte forma:
· Receitas vinculadas ao objeto social da empresa – É aplicado um percentual de presunção de lucro sobre as receitas e, sobre esse resultado, incidem os tributos (IRPJ e CSLL), além de PIS e COFINS sobre a receita;
· Outras receitas e ganhos não vinculados ao objeto social – A tributação (IRPJ e CSLL) incide diretamente sobre tais receitas e ganhos, sem ser aplicado o percentual de presunção de lucro.
Desta forma, quando estamos falando da venda de imóveis por uma Holding Patrimonial, é possível que a tributação ocorra de acordo com uma das modalidades acima. Porém, não se trata de uma escolha sobre qual situação a Holding terá a menor tributação e sim pela classificação de fato destes imóveis em seu ativo, como citado anteriormente.
Como premissa para a classificação contábil dos imóveis e consequentes tributação, o objeto social constante no contrato social da Holding é o ponto de partida, assim como a finalidade da aquisição deve prevalecer para o enquadramento, ou seja, quando da aquisição ou construção do imóvel. De forma conservadora, não é indicado a reclassificação contábil destes ativos, como veremos em seguida.
Por exemplo, se a Holding Patrimonial possui em seu objeto social a atividade de compra e venda de imóveis próprios e quando adquiriu ou construiu o imóvel, este era o seu objetivo, a classificação contábil deverá ser no grupo Estoques e quando vendido, sofrerá uma tributação efetiva (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS) de 5,93% sobre o preço de venda, além do adicional variável do IRPJ, que pode levar a tributação total próxima a 7,00%.
Por outro lado, se não houver previsão dessa atividade no objeto social da Holding Patrimonial ou se o imóvel não foi adquirido para este fim, estando classificado como Ativo Não Circulante, a tributação será sobre o ganho de capital (valor da venda, menos valor de custo), cuja alíquota total (IRPJ e CSLL) será de 24%, podendo agregar mais 10% do Adicional do IRPJ.
Analisando desta forma, parece obvio que a classificação como Estoque gera uma tributação mais vantajosa, mas nem sempre é assim. Tudo depende dos valores da negociação e da margem de lucro negociada. Lembrando, como dito anteriormente, que não se trata de uma escolha, muito menos de um “planejamento tributário”. Muito antes disso devemos planejar a constituição de uma Holding Patrimonial sob o aspecto societário e sim, analisar os possíveis reflexos tributários das operações.
É muito comum nos depararmos no mercado com “planejamentos tributários” que consistem na reclassificação de bens do Ativo Imobilizado para a conta de Estoques com o intuito de posterior venda a terceiros e consequente redução dos tributos a pagar. Porém, grande parte desses “planejamentos tributários” são realizados sem levar em consideração os riscos tributários envolvidos, fazendo com que o administrador da Holding Patrimonial esteja sob risco de autuação fiscal.
Há um bom tempo esse tipo de operação está na mira da Receita Federal. A título de exemplo, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) se manifestou sobre essa questão, por meio do Acórdão 1101-000.929/2013, o qual dispõe:
“Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica – IRPJ Ano-calendário: 2008
LUCRO PRESUMIDO. VENDA DE IMÓVEIS. ATIVO PERMANENTE
O resultado da venda de imóveis contabilizados no Ativo Permanente é tributado como ganho de capital, ainda que antes da alienação eles sejam destinados à revenda e no contrato social da alienante haja previsão, dentre outras, de atividade imobiliária.
A legislação somente permite a incidência sobre a margem presumida de lucro calculada a partir da receita de venda do imóvel quando este é adquirido para revenda.”
Observação: O termo Ativo Permanente foi substituído por Ativo Não Circulante.
Em outra manifestação em 2017, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) julgou incorreta a reclassificação contábil lançada por pessoa jurídica, quando da apuração de ganho de capital, pela venda de ativo e consequentemente, manteve autuação para pagamento de diferença.
Mais recentemente, a Receita Federal aprovou a Instrução Normativa RFB nº 1700/2017, que consolidou as regras de apuração do IRPJ e CSLL das pessoas jurídicas, a qual dispõe em seu art. 215, §14, que o ganho de capital nas alienações de ativos não-circulantes classificados como investimento, imobilizado ou intangível, ainda que reclassificados para o ativo circulante com a intenção de venda, deve ser tributado como ganho de capital, não permitindo a aplicação do percentual de presunção.
Ou seja, ficou pacificado o seguinte entendimento na esfera administrativa:
Venda de Estoque | Venda de Ativo Não-Circulante | |
Tributação | 5,93% sobre o valor da venda, mais adicional de IRPJ | 24% sobre o ganho de capital, mais adicional de IRPJ |
Classificação Contábil | O imóvel deve ser classificado como Estoque desde a sua data de aquisição | O imóvel já esteve classificado em algum momento como Ativo Não-Circulante |
Objeto Social | Requer que a empresa tenha objeto social de compra e venda de imóveis próprios | Não requer o objeto social de compra e venda de imóveis próprios |
Intenção de Venda | Aplicável somente para imóveis adquirido com intenção de posterior revenda (que nunca tenham sido alugados a terceiros) | Aplicável nos demais casos, principalmente quando o imóvel é utilizado pelos proprietários, cedido em comodato ou alugado a terceiros |
Considerações Finais
Dessa forma, entendemos que o “planejamento tributário” envolvendo a reclassificação de bens do Ativo Imobilizado para a conta de Estoques, com o intuito de reduzir a carga tributária na venda de tais bens, está associado ao risco de autuação por parte do fisco. Inclusive, o fisco é obrigado a seguir a Instrução Normativa RFB nº 1700/2017, que implicaria em autuar os contribuintes que adotassem a referida prática.
Importante salientar que muitos advogados tributaristas defendem que esse entendimento por parte do fisco é abusivo e veem a oportunidade do ajuizamento de medida judicial a fim de assegurar o direito de aplicação do percentual de presunção de lucro sobre as receitas de venda de imóveis pelas Holdings Patrimoniais.
Maurício Gatti
Sócio Diretor da Gatti Contabilidade